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quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Entrevista de Roberto Alvim para o site Colherada Cultural


Do site: http://bravonline.abril.com.br/materia/esta-sendo-imprescindivel-reinventar-o-teatro-e-o-ser-humano-a-cada-montagem

“Está sendo imprescindível reinventar o teatro - e o ser humano - a cada montagem”

O diretor Roberto Alvim conversa sobre a Mostra Brasileira de Dramaturgia Contemporânea
por Por Estela Cotes


À frente da Cia Club Noir, o diretor Roberto Alvim chamou a atenção da critica com a encenação de O Quarto, texto de Harold Pinter, escolhido como melhor espetáculo de 2009 pelo Prêmio Bradesco BRAVO! de Cultura. O grupo tem como principais características a penumbra no cenário e a força nas palavras aceleradas.
Como um dos representantes do teatro contemporâneo brasileiro, o também dramaturgo resolveu montar uma programação dedicada a esta seara. A Mostra Brasileira de Dramaturgia Contemporânea começou no final de julho e terá seu fim somente em abril de 2013. A cada mês uma peça inédita é estreada com curadoria de Roberto Alvim.
Até o dia 6 de setembro está em cartaz (Em) Branco, de Patrícia Kamis. A programação segue com:Aqui, de Martina Sohn Fischer (de 11 de setembro a 4 de outubro); Happycinio, de Angélica Kauffmann (de 9 de outubro a 1º de novembro); Procurado, de Diego Fortes (de 13 de novembro a 6 de dezembro); Fatia de Guerra, de Andrew Knoll (de 15 de janeiro a 7 de fevereiro de 2013); Agro Negócio, de Marco Catalão (de 12 de fevereiro a 7 de março) e Grimorium, de Alexandre França (de 12 de março a 4 de abril).
Roberto Alvim bateu um papo com o Colherada Cultural sobre esta seleção.
COLHERADA CULTURAL: Quais foram os critérios para a seleção dos textos?

ROBERTO ALVIM: Procuramos peças da ordem da invenção: obras que trabalham com novos sistemas complexos de relações formais, distintos de qualquer forma ou discurso reconhecível. Textos que não reproduzem o mundo, mas que criam outros mundos, habitados por outras formas de vida - outras possibilidades de experienciarmos o tempo, o espaço e a condição humana. 
Durante o período de seleção, líamos os textos e pensávamos "isto já existe no mundo?" Se a resposta fosse sim, então a obra não nos interessava. Escolhemos oito textos (depois de termos lido mais de 100 peças) que são aparentemente impossíveis de serem encenados. É preciso inventar novos procedimentos de encenação e de atuação para “presentificar” estas peças, que se colocam como alteridades radicais em relação a todo teatro tradicional.


C.C.: A partir desta mostra é possível descrever algumas características do teatro contemporâneo brasileiro?

R.A.: Fizemos um recorte muito específico na Mostra, que não corresponde a todo o espectro de possibilidades que existem hoje no teatro brasileiro. O que nos interessava eram obras que trabalhassem no campo da arte, e não no campo da cultura. Cultura é o senso-comum, as formas e discursos hegemônicos que pululam nos produtos culturais; arte é sempre invenção, é a criação de experiências estéticas que ampliam nossas vivências em direções insuspeitadas, imprevisíveis. Neste sentido, os sistemas cênicos criados pelos oitos autores são arte de ponta, tanto no âmbito nacional quanto no âmbito internacional. 


C.C.: Existem temas comuns que permeiem os autores?

R.A.: São obras absolutamente singulares, e cada uma delas inventa um sistema formal próprio, único, fundante. Cada um dos textos instaura procedimentos técnicos novos, que traduzem e expandem visões de mundo descoladas de operações dramáticas pré-existentes. O que elas têm em comum é a pulsão de inventar veredas estéticas outras, que expandam o working space do teatro - e que, portanto, expandam a experiência humana de nosso tempo.


C.C.: Quanto às montagens, também é possível reconhecer pontos comuns?

R.A.: Não. Tivemos que inventar novas formas de atuação e encenação em cada uma delas, porque cada uma delas inventa diferentes desenhos do ser humano em cena. Nenhuma das técnicas existentes dá conta destes textos; está sendo imprescindível reinventar o teatro - e o ser humano - a cada montagem.


C.C.: Algumas peças contemporâneas acabam sendo tachadas como herméticas, "para poucos", difíceis... Como está sendo a reação do público durante a mostra? 

R.A.: Não podemos parar diante de um quadro de Pollock e procurarmos o sistema formal com o qual Velázquez trabalhava. Se fizermos isso, Pollock parecerá um péssimo pintor... Cada artista cria um sistema formal próprio, que proporciona uma experiência estética específica. O público que lota as sessões no Club Noir já sabe de antemão que nossas montagens propõe sempre que o espectador caminhe por veredas desconhecidas. E a reação tem sido incrível; as pessoas voltam diversas vezes para ver os mesmos espetáculos, para passar novamente por experiências que são da ordem da alteridade. Não há nenhum hermetismo aqui, muito ao contrário: as peças são poesia, e só a poesia proporciona infinitas possibilidades de interpretação para os espectadores. O que se estabelece nos espetáculos é a proposição radical de aventuras estéticas inovadoras. Quem aceita o convite, experiencia uma ampliação da percepção.


C.C.: Já pensa em uma segunda edição para o ano que vem?

R.A.: Sim, queremos que este projeto se perpetue. A Mostra é a apresentação ao público de novos autores, que acreditam na força revolucionária de escrituras que reinventam o mundo e a humanidade, ampliando as possibilidades de habitarmos a existência. Trata-se de algo histórico, fundamental, de uma importância crucial para o teatro contemporâneo brasileiro - posto que coloca a dramaturgia de nosso país em um lugar singular no panorama da arte internacional.
Serviço
Club Noir
Rua Augusta, 331 – Consolação
Tel.: (11) 3255-8448 / 3257-8129
Mostra: terças, quartas e quintas às 21h
Grátis

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